segunda-feira, 25 de julho de 2011

Mariangela Paone

O mundo não mudou, mudaram os protestos



Há dez anos o movimento antiglobalização confrontou o G8 e teve um final trágico em Gênova. Das grandes marchas se passou à mobilização local. Seu espírito está nos "indignados" de Madri? A reportagem é de Mariangela Paone e publicada pelo jornal El País e reproduzida pelo Portal Uol, 25-07-2011.
Fonte: UNISINOS


Uma cidade sitiada, dividida em zonas de segurança, com uma área inexpugnável protegida por 20 mil policiais e soldados. Assim amanheceu Gênova em 20 de julho de 2001, e horas depois, enquanto se realizava a cúpula do G8, se consumou uma batalha urbana sem precedentes. A maior manifestação do movimento antiglobalização, que reuniu mais de 150 mil pessoas, acabou com centenas de feridos nos distúrbios e nos ataques policiais e com uma vítima fatal: o jovem italiano Carlo Giuliani.

A violência daqueles dias marcou um antes e um depois naquela etapa de mobilizações maciças contra os grandes símbolos do sistema econômico internacional que começaram em Seattle em 1999. Uma década depois, o que resta do movimento que marcou uma geração e que parecia ter desaparecido depois de Gênova? Que relação há com a nova onda de protesto que atravessa a Europa?

"Eles [os representantes do G8] modificaram sua encenação simbólica e prática nesse tipo de evento nas grandes capitais, nos centros onde se representava o poder. Em Gênova, com a cidade velha sitiada, parecia um conflito medieval. O movimento, por sua vez, se reconfigurou, depois da repressão aterrissou e rediscutiu muitas coisas. Defendeu baixar para o nível local, sempre mirando o global", conta o ativista espanhol Chabier Nogueras.

Suas palavras são quase as mesmas que Susan George utiliza. Como vice-presidente da plataforma altermundista Attac e presidente do comitê de planejamento do Instituto Transnacional de Amsterdã, foi uma das referências do movimento e também esteve em Gênova naqueles dias: "As coisas mudaram. Não houve mais manifestações imensas como aquela. Depois da morte de Carlo Giuliani, as pessoas começaram a pensar que era impossível se expor a essa violência. Começamos a trabalhar em grupos menores sobre assuntos específicos. Mas depois de Gênova o movimento não ficou mais frágil, só atuou de forma diferente. Menos mobilizações maciças, mas mais trabalho em profundidade sobre o comércio, o feminismo, a taxação de transações financeiras, a Europa e o neoliberalismo".

Nogueras experimentou na primeira pessoa a violência que se viveu em Gênova há dez anos. Havia chegado de Zaragoza à cidade italiana com um grupo do Movimento de Resistência Global, e na noite de 21 para 22 de julho se encontrava na escola Diaz, um instituto onde muitos manifestantes se alojavam depois das marchas dos dias anteriores. Durante a noite a polícia irrompeu, atacou as pessoas que dormiam na escola e deteve dezenas delas. A decisão judicial do Tribunal de Apelação de Gênova que condenou os agentes que realizaram a operação inclui as consequências físicas que Nogueras sofreu: traumatismo craniano, contusões em várias partes do corpo, lesão do perônio, lesões graves com 40 dias de baixa. "O Ministério Público disse que o que ocorreu ali foi uma luta global", lembra.

Segundo Enara Echart, pesquisadora do Instituto Universitário para o Desenvolvimento e a Cooperação, da Universidade Complutense de Madri, e autora de vários livros sobre os movimentos sociais e o movimento antiglobalização, é verdade que Gênova acabou com um ciclo. "Houve um recuo para uma estratégia que dava maior importância à proposta que ao protesto. Não é que este desapareça, mas recua para o âmbito local. O movimento antiglobalização em longo prazo precisava encontrar núcleos de mobilização mais próprios de cada lugar."

A falta de propostas concretas era uma das críticas mais frequentes que o movimento recebeu, a mesma que em certa medida se fez agora aos indignados. Echart acredita que na época, assim como agora, a crítica se baseia em um erro: "quando ocorrem mobilizações tão importantes, tenta-se pedir demais, enquanto os processos políticos são muito mais lentos. Os movimentos sociais, no momento em que se manifestam, já estão fazendo política... O bonito, o politicamente mais interessante do 15-M, é seu caráter transversal. Não se pode exigir deles um programa político, temos que deixar o processo agir".

A comparação entre o movimento antiglobalização, em todas as suas expressões, e as manifestações que nos últimos meses chamaram a atenção da mídia deixa como resultado muitos paralelos, mas também diferenças. Uma é precisamente a transversalidade. "Sociologicamente, o movimento dos indignados é mais transversal, e por isso os governos atuaram com mais prudência. Muita gente se reúne voluntariamente. Mas retomam muitas das questões que colocávamos, e sim há conexões internacionais, mas é verdade que não parte, como então, de um trabalho internacional", comenta Nogueras. Ele pensa que se o 15-M é mais transversal também é porque, diante da crise econômica mundial, "os mesmos especialistas reconhecem que o modelo fracassou" e é "muito mais simples que qualquer um compreenda o que se diz".

A verdade é que os indignados têm um apoio popular que o movimento antiglobalização não alcançou. Em seu último número, a revista "The Economist", em um artigo sobre o movimento espanhol dos indignados, cita o estudo apresentado em junho pela Havas Media, que calcula o apoio popular em 80% dos cidadãos e define os indignados da Espanha como "os manifestantes mais conscientizados da Europa": não atiram pedras, mas conseguem que suas demandas calem na sociedade, afirma o semanário, citando as declarações do candidato socialista Alfredo Pérez Rubalcaba a favor de uma reforma eleitoral e o debate sobre as hipotecas.

"Não houve lançamento de pedras nem de gás lacrimogêneo", escreveu "The Economist" sobre a última manifestação de 19 de julho. Isso ocorreu em Seattle, em Gênova, em Gotemburgo, e as imagens de ações violentas de uma minoria conquistaram toda a atenção. Ações que até o momento foram alheias ao movimento dos indignados.

"Mas o que acontecerá se as demandas dos novos protestos não forem atendidas?", pergunta-se Aitor, um dos espanhóis que sofreu o ataque à escola Diaz em 2001 e que agora participa dos protestos contra os despejos. "É verdade que se faz questão de manter o protesto em algumas estratégias concretas, na ação direta não violenta. Mas se gerarem situações de tensão é mais difícil saber o que pode acontecer", diz.

Vittorio Agnoletto foi o porta-voz do Fórum Social durante as jornadas de Gênova em 2001. Sobre o que aconteceu naqueles dias, não acredita que por parte do movimento haja algo a censurar -- "fizemos tudo de forma transparente e fomos vítimas de uma repressão decidida internacionalmente", afirma --, mas diz que, se houve equívocos no movimento, foi "o erro político, estratégico, de não ter conseguido traduzir as grandes campanhas em questões da vida cotidiana que afetam as pessoas. Mas em Gênova foi semeado um germe cujo resultado colhemos na Itália há algumas semanas, com o referendo que rejeitou a privatização da água e da energia nuclear".

"Tínhamos razão quando falamos que o modelo de desenvolvimento ameaçava a biosfera, quando dizíamos que íamos enfrentar uma crise econômica gravíssima, com graves consequências sociais. Agora a situação é muito pior que dez anos atrás. Nestes dias organizamos uma exposição em Gênova sob o título de Cassandra, o movimento previu através da análise o que aconteceria, mas não conseguiu mudar o curso da história", diz Agnoletto, que hoje estará na cidade italiana para as comemorações do décimo aniversário daquela mobilização.

Nogueras também estará em Gênova, junto com sua companheira, que dentro de alguns meses o tornará pai. Para falar do que aconteceu, para que não se perca a memória do que a Anistia Internacional definiu em 2001 como "a mais grave suspensão dos direitos democráticos em um país ocidental depois da Segunda Guerra Mundial". Foi antes do 11 de Setembro. O que veio depois chegou a superar os trágicos dias de Gênova.

Em 2009, no prólogo da nova edição do livro de culto do movimento, "No Logo", sua autora, Naomi Klein, refletia dez anos depois da publicação de seu texto sobre o destino do movimento. "Em algumas partes do mundo, em particular na América Latina, a onda de resistência se desenvolveu e reforçou. Em alguns países os movimentos sociais cresceram o suficiente para se unir aos partidos políticos, ganhando eleições nacionais e estabelecendo um novo regime regional de comércio justo. Mas em outros lugares o movimento desapareceu com o 11 de Setembro. Como se o que sabíamos sobre a complexidade do corporativismo global - que todas as injustiças do mundo não podem ser atribuídas só a um partido de direita, a um Estado, independentemente de seu poder - tivesse desaparecido." "Mas se há um momento para lembrar o que aprendemos no início do milênio é agora", acrescenta.

Fatos do altermundismo

- O começo em Seattle. Em 30 de novembro de 1999, um grupo de manifestantes bloqueou a entrada dos delegados da cúpula da Organização Mundial do Comércio na cidade americana. O protesto continuou durante os quatro dias da cúpula.

- Dos EUA para a Europa. Em abril de 2000 em Washington, cerca de 3 mil pessoas tentaram abortar uma cúpula do Banco Mundial e do FMI. Em setembro, 10 mil manifestantes se mobilizaram em Praga contra as mesmas instituições. No dia 23 se organizou um encontro entre representantes do movimento e do Banco Mundial, graças à mediação do presidente checo Vaclav Havel.

- A época dos fóruns sociais. Em janeiro de 2001 em Porto Alegre foi organizada a primeira contracúpula, enquanto em Davos se reunia o Fórum Econômico Mundial. As primeiras três edições foram na cidade brasileira. Depois vieram Mumbai, Caracas, Nairóbi, Belém e Dacar.

- A batalha de Gênova. Em julho de 2001, por motivo do G8, a cidade italiana recebeu mais de 150 mil pessoas. O que seria uma marcha pacífica terminou com a morte do jovem de 23 anos Carlo Giuliani e centenas de feridos. A cidade foi um campo de batalha.

Paul Krugman

"Podemos estar perto de reviver a crise de 1930"

Para aqueles que conhecem a história da década de 1930, o que está ocorrendo agora é muito familiar. Se alguma das atuais negociações sobre a dívida fracassar, poderemos estar perto de reviver 1931, a bancarrota bancária mundial que alimentou a Grande Depressão. Mas se as negociações tiverem êxito, estaremos prontos para repetir o grande erro de 1937: a volta prematura à contração fiscal que terminou com a recuperação econômica e garantiu que a depressão se prolongasse até que a II Guerra Mundial finalmente proporcionasse o "impulso" que a economia precisava. O artigo é de Paul Krugman, publicado no SinPermiso. Tradução: Katarina Peixoto Krugman é professor de Economía em Princeton e Prêmio Nobel 2008.
Fonte: Carta Maior


Esta é uma época interessante, e digo isso no pior sentido da palavra. Agora mesmo estamos vivendo, não uma, mas duas crises iminentes, cada uma delas capaz de provocar um desastre mundial. Nos EUA, os fanáticos de direita do Congresso podem bloquear um necessário aumento do teto da dívida, o que possivelmente provocaria estragos nos mercados financeiros mundiais. Enquanto isso, se o plano que os chefes de Estado europeus acabam de pactuar não conseguir acalmar os mercados, poderemos ter um efeito dominó por todo o sul da Europa, o que também provocaria estragos nos mercados financeiros mundiais.

Somente podemos esperar que os políticos em Washington e Bruxelas consigam driblar essas ameaças. Mas há um problema: ainda que consigamos evitar uma catástrofe imediata, os acordos que vêm sendo firmados dos dois lados do Atlântico vão piorar a crise econômica com quase toda certeza.

De fato, os responsáveis políticos parecem decididos a perpetuar o que está sendo chamado de Depressão Menor, o prolongado período de desemprego elevado que começou com a Grande Recessão de 2007-2009 e que continua até o dia de hoje, mais de dois anos depois de que a recessão, supostamente, chegou ao fim.

Falemos um momento sobre por que nossas economias estão (ainda) tão deprimidas. A grande bolha imobiliária da década passada, que foi um fenômeno tanto estadunidense quanto europeu, esteve acompanhada por um enorme aumento da dívida familiar. Quando a bolha estourou, a construção de residências desabou, assim como o gasto dos consumidores na medida em que as famílias sobrecarregadas de dívidas faziam cortes.

Ainda assim, tudo poderia ter ido bem se outros importantes atores econômicos tivessem aumentado seu gasto e preenchido o buraco deixado pela crise imobiliária e pelo retrocesso no consumo. Mas ninguém fez isso. As empresas que dispõem de capital não viram motivos para investi-lo em um momento no qual a demanda dos consumidores estava em queda.

Os governos tampouco fizeram muito para ajudar. Alguns deles – os dos países mais débeis da Europa e os governos estaduais e locais dos EUA – viram-se obrigados a cortar drasticamente os gastos diante da queda da receita. E os comedidos esforços dos governos mais fortes – incluindo aí o plano de estímulo de Obama – apenas conseguiram, no melhor dos casos, compensar essa austeridade forçada.

De modo que temos hoje economias deprimidas. O que propõem fazer a respeito os responsáveis políticos? Menos que nada. A desaparição do desemprego da retórica política da elite e sua substituição pelo pânico do déficit tem verdadeiramente chamado a atenção. Não é uma resposta à opinião pública. Em uma sondagem recente da CBS News/The New York Times, 53% dos cidadãos mencionava a economia e o emprego como os problemas mais importantes que enfrentamos, enquanto que somente 7% mencionava o déficit. Tampouco é uma resposta à pressão do mercado. As taxas de juro da dívida dos EUA seguem perto de seus mínimos históricos.

Mas as conversações em Washington e Bruxelas só tratam de corte de gastos públicos (e talvez de alta de impostos, ou seja, revisões). Isso é claramente certo no caso das diversas propostas que estão sendo cogitadas para resolver a crise do teto da dívida nos EUA. Mas é basicamente igual ao que ocorre na Europa.

Na quinta-feira, os “chefes de Estado e de Governo da zona euro e as instituições da UE” – esta expressão, por si só, dá uma ideia da confusão que se tornou o sistema de governo europeu – publicaram sua grande declaração. Não era tranquilizadora. Para começar, é difícil acreditar que a complexa engenharia financeira que a declaração propõe possa realmente resolver a crise grega, para não falar da crise europeia em geral.

Mas mesmo que pudesse, o que ocorreria depois? A declaração pede drásticas reduções do déficit “em todos os países salvo naqueles com um programa” que deve entrar em vigor “antes de 2013 o mais tardar”. Dado que esses países “com um programa” se veem obrigados a observar uma estrita austeridade fiscal, isso equivale a um plano para que toda a Europa reduza drasticamente o gasto ao mesmo tempo. E não há nada nos dados europeus que indique que o setor privado esteja disposto a carregar o piano em menos de dois anos.

Para aqueles que conhecem a história da década de 1930, isso é muito familiar. Se alguma das atuais negociações sobre a dívida fracassar, poderemos estar perto de reviver 1931, a bancarrota bancária mundial que tornou grande a Grande Depressão. Mas se as negociações tiverem êxito, estaremos prontos para repetir o grande erro de 1937: a volta prematura à contração fiscal que terminou com a recuperação econômica e garantiu que a depressão se prolongasse até que a II Guerra Mundial finalmente proporcionasse o impulso que a economia precisava.

Mencionei que o Banco Central Europeu – ainda que, felizmente, não a Federal Reserve – parece decidido a piorar ainda mais as coisas aumentando as taxas de juros?

Há uma antiga expressão, atribuída a diferentes pessoas, que sempre me vem à mente quando observo a política pública: “Você não sabe, meu filho, com que pouca sabedoria se governa o mundo”. Agora, essa falta de sabedoria se apresenta plenamente, quando as elites políticas de ambos os lados do Atlântico arruínam a resposta ao trauma econômico fechando os olhos para as lições da história. E a Depressão Menor continua.

(grifos do blog)

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Ruy Castro

Contra papai e mamãe


Artigo de Ruy Castro (foto)  publicado na Folha de São Paulo, 18/07/2011.
Fonte: Folha de São Paulo


Theodore Roszak, o inventor da palavra "contracultura", morreu outro dia na Califórnia, aos 77 anos. Era um historiador, um observador social, um pensador multidisciplinar. Mas só será lembrado por seu livro de 1968, "A Contracultura", em que cunhou a expressão e tentou dar um sentido a tudo que envolvia a juventude naquela época.

O que não era pouco. De repente, milhões de rapazes e moças em toda parte se levantaram contra o "sistema" -leia-se o governo, os políticos, a Guerra do Vietnã, as ditaduras militares, os professores, a autoridade em geral, a moral estabelecida, a sociedade de consumo, a arte "bem-feita", o barbeiro do bairro, os maiores de 30 anos ou, à falta de melhor, papai e mamãe. Mas não significava que todos protestassem contra as mesmas coisas.

A contracultura foi a passagem do primado da razão (que levou uma parte ultrapolitizada da juventude a lutar contra as ditaduras, as desigualdades sociais, o sistema universitário, a censura etc.) ao primado da não razão (que fez com que outra parte preferisse "cair fora" das cidades e ir queimar fumo, tomar ácido, fazer filhos, plantar coquinhos, catar piolhos e ouvir Jimi Hendrix no meio do mato).

Durante algum tempo, pareceu que a segunda facção -a dos hippies, drop-outs, psicodélicos, místicos, ocultistas e alienados em geral- iria prevalecer. Prometia-se um novo homem, sem os velhos defeitos. Até que, naturalmente, o "sistema" absorveu esse antirracionalismo, converteu-o em produtos e serviços, e o pôs à venda. A contracultura se tornou a nova cultura, e tão careta quanto.

Roszak nunca aceitou bem essa conclusão. Para ele, os ecos da contracultura estão entre nós até hoje -na informalidade ao vestir, na comida mais saudável, na ecologia, nos direitos humanos. Tudo bem. Mas o novo homem não veio, só mudaram os defeitos.

domingo, 17 de julho de 2011

Estado espanhol: o movimento dos ''indignad@s'' e suas perspectivas

Além das particularidades de cada país, aquilo que passa tanto no Estado espanhol como na Grécia, depois da irrupção das revoltas no mundo árabe, terá repercussões em todo o continente. Daqui resulta a importância de analisar em profundidade a realidade e o potencial destas grandes mobilizações. Esther Vivas e Josep Maria Antentas nos dão aqui sua opinião sobre o significado do movimento dos “indignad@s”.  A entrevista é de Jean-Philippe Divès para o periódico Tout est à Nous e nos foi enviada por Esther Vivas. A tradução é de Benno DIschinger.
Fonte: UNISINOS




Como definiria as características centrais deste movimento?

Josep Maria: O movimento começou absolutamente por surpresa. As manifestações de 15 de maio (15M) foram muito maiores do que o esperado e a arrancada dos acampamentos foi espontânea. Desde o começo da crise a reação social havia sido muito débil. Finalmente tudo estalou de forma inesperada, “intempestiva”, como diria Daniel Bensaïd. E, como quase sempre que começa um grande movimento social, este se fez com a juventude como protagonista em sua fase inicial, e com formas de protesto inovadoras e disruptivas. Expressa no mínimo a radicalização social mais importante desde faz mais de dez anos, quando emergiu o movimento antiglobalização, embora atualmente, em plena crise, a profundidade social e territorial do movimento seja maior.

Esther Vivas: O movimento de 15 de maio tem um duplo eixo de crítica. Por um lado, a classe política e, pelo outro, os poderes econômicos e financeiros, como bem resume o lema “Não somos mercadorias em mãos de políticos e banqueiros”. As revoltas no mundo árabe tem sido um referencial e assim o põem de manifesto as ocupações de praças e os acampamentos, tomando como exemplo, entre outros, a Plaza Tahrir. Estas têm sido um palanque para impulsionar futuras mobilizações e um alto-falante para amplificar as atuais. Atuaram como referencial simbólico e como base de operações e não têm sido um fim em si mesmas. A internet e as redes sociais, Twitter e Facebook, desempenharam um papel-chave como espaço de discussão, de politização e de formação de uma identidade e um acervo compartilhado, além de serem um instrumento a serviço da mobilização social.

Do exterior se tem a impressão de que a ruptura com o movimento operário organizado, sindicatos e partidos, é ainda mais importante do que na Grécia... O que se passou com os sindicatos depois da longa greve geral de 29 de setembro do ano passado?

Esther Vivas: Depois da greve geral de 29 de setembro os sindicatos majoritários voltaram à sua prática habitual de desmobilização. A greve geral foi um parêntesis no tempo e não significou uma mudança de orientação. Em janeiro, CCOO e UGT e o Governo firmaram o acordo sobre a reforma das pensões, que aumentava os anos de cotização para cobrar a pensão. Isto encerrou brutalmente qualquer expectativa de mobilização social. Os sindicatos majoritários ficaram desconcertados por um movimento que não previam e que os interpela. Agora está por ser vista sua reação e se o movimento será suficientemente forte para forçar algum tipo de virada de sua parte. Em muitos acampamentos, como o de Barcelona, saiu claramente a petição de uma greve geral e também a vontade de “levar a indignação aos centros de trabalho”, onde ainda há muito medo e resignação.

Josep Maria: O movimento expressa uma recusa frontal às políticas do governo Zapatero. Esquerda Unida manifestou suas simpatias pelos protestos, mas em geral tem sido muito exterior aos mesmos, sem um vínculo militante real. A esquerda extra-parlamentar e alguns sindicatos alternativos estiveram, sim, presentes no movimento, junto com uma multidão de pessoas não organizadas ou em coletivos sociais. Os setores em luta, como os trabalhadores da saúde na Catalunha, mobilizados contra os cortes, tiveram também um papel ativo e visível.

Com o desenvolvimento da mobilização, há um avanço nas reivindicações e no nível de consciência?

Esther Vivas: A jornada de mobilizações de 19 de junho (19J) mostrou como o movimento se deslocava da esquerda e se aprofundava em suas reivindicações. Alguns dos slogans mais correntes em muitas das manifestações foram as críticas dirigidas ao Pacto do Euro, contra os cortes sociais, contra os bancos e também a demanda de uma greve geral. Observa-se um ambiente de radicalização, embora de maneira imprecisa e difusa, em clamores como “a revolução começa aqui”, contada em muitos acampamentos. Outro movimento-chave de radicalização política foi a jornada de 15 de junho, quando em Barcelona se tentou bloquear o Parlamento da Catalunha, durante o debate parlamentar dos pressupostos do Governo catalão e onde se propunham os cortes sociais mais importantes desde a democracia.

Josep Maria: O movimento, desde seu começo, tem passado por várias provas que lhe permitiram amadurecer e aprofundar-se em seu discurso, como por exemplo, a vitória ante o intento de desalojamento em Barcelona no passado dia 27 de maio, ou a criminalização sofrida após o bloqueio ao Parlamento da Catalunha aos 15 de junho. A denúncia e a utilização do déficit como uma excusa para cortar direitos está presente na política do movimento. No caso da Catalunha, por exemplo, o rechaço aos pressupostos do Governo catalão, que incluem fortes cortes na saúde e educação, tem sido um dos aspectos-chave do movimento.

Na opinião de vocês, o que vai permanecer deste movimento? Há possibilidades que subsistam formas de estruturação mais permanentes?

Esther Vivas: A partir dos primeiros acampamentos e ocupações de praças em grandes cidades, o exemplo se estendeu a cidades médias e pequenas, bem como aos bairros das grandes urbes. Também se estabeleceram coordenações de assembléias de povoados e bairros. E elas constituem, de fato, alguns dos principais êxitos do movimento. Esperamos um outono quente com novas mobilizações, como a jornada do 15 de outubro, e com lutas concretas frente aos cortes sociais.

Josep Maria: Não estamos ante um movimento conjuntural, senão ante a ponta do iceberg de uma previsível nova onda de mobilizações. O 15M e os acampamentos têm sido a primeira sacudida e atuaram como lançadeira. Nestas semanas, o movimento se ampliou, diversificando-se social e geracionalmente, e se arraigou territorialmente. O êxito da jornada de manifestações do 19J mostrou-o claramente. Em menos de um mês o crescimento quantitativo e qualitativo tem sido muito grande.

Qual é o impacto sobre o panorama político no Estado espanhol? Significa ou pode provocar importantes mudanças?

Josep Maria: O movimento surgido com o 15M teve um forte impacto na opinião pública e desfrutou de uma grande centralidade midiática. Ninguém esperava o enorme êxito do 15M e menos ainda o que viria depois. Tem sido umas semanas que mudaram a paisagem político-social do conjunto do Estado espanhol. Elas são uma mostra do rechaço das políticas aplicadas pelo Governo Zapatero e também um sinal muito claro para a direita, que aspira a ganhar as próximas eleições gerais, de que vai encontrar-se com um panorama de agitação social quando chegar ao poder.

Esther Vivas: Estas mobilizações significam, sem dúvida, um ponto de inflexão e o início de uma nova etapa. Muitas pessoas têm dito que “nada será como antes”, e assim é. O movimento conseguiu pôr fim à passividade resignada e ao desânimo que até agora imperava. O presente nos abriu uma brecha de esperança no futuro.

[grifos do blog]

A fé ameaça quebrar os EUA

"Como fazem as seitas, fundamentalismo do Tea Party, ao pedir zero de aumento de impostos, leva ao risco de suicídio coletivo", escreve Clóvis Rossi, jornalista, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo,17-07-2011.
Fonte: UNISINOS


O enrosco entre o presidente Barack Obama e os republicanos, em torno do aumento do teto de endividamento, não é uma questão política, econômica, contábil.

Trata-se de fé, de fundamentalismo religioso de parte dos integrantes do chamado Tea Party, o grupo de extrema-direita que emergiu com força na eleição de 2010. Estão sempre possuídos de uma Estado-fobia que supera o que Paul Krugman, ontem neste mesmo espaço, chamava de loucura antiga dos republicanos.

Ajuda-memória: até o dia 2, o Congresso tem que autorizar o aumento do teto de endividamento, que está em US$ 14 trilhões, número inimaginável. Dá cerca de sete vezes tudo o que o Brasil produz por ano de bens e serviços.

Sem a autorização, o governo quebra. Não poderia mandar, por exemplo, o cheque para o velhinho aposentado de Utah ou o dinheiro, bem mais suculento, para os investidores chineses que compram aos cachos papéis do Tesouro norte-americano. Nem mesmo para o Brasil, terceiro maior comprador da dívida dos EUA.

A contrapartida da autorização terá que ser um ajuste fiscal de cerca de US$ 4 trilhões (dois Brasis). Ajuste fiscal, em qualquer lugar do mundo, compõe-se de duas fatias não necessariamente iguais: corte de gastos e aumento das receitas do governo.

Até a emergência do fundamentalismo do Tea Party, loucos ou não, os republicanos discutiriam com os democratas até que as duas partes se convencessem de que nada mais poderiam extrair da outra. O acordo sairia, na undécima hora, mas sairia.

Aí é que surge o fundamentalismo com que os republicanos do Tea Party abordam a negociação. Ela já começou desequilibrada a favor do corte de gastos: Obama, em abril, propunha US$ 1,5 trilhão de aumento de impostos (em 10 anos). Ou seja, 37,5% do ajuste viria do aumento de receitas; os dois terços restantes do corte de gastos.

Os republicanos refugaram, e a mais recente proposta do presidente, já em julho, passou a ser de US$ 750 bilhões. Ou seja, menos de 20% do ajuste viria do aumento de impostos e mais de 80% do corte de gastos.

Nem assim os republicanos estão aceitando. Não é que Obama queira, por exemplo, aumentar o imposto sobre valor agregado, que machuca todos os contribuintes, independentemente de sua renda. Não.

Acha apenas, como disse sexta-feira, que "milionários e bilionários podem fazer um pouco mais", que é possível fechar "os buracos corporativos de forma que as companhias de petróleo não consigam desnecessárias isenções fiscais ou que os donos de jatinhos corporativos delas se beneficiem".

Enfim, nada que não seja o mais clássico preceito tributário segundo o qual paga mais quem pode mais. Mas não basta para a turma do Tea Party, que quer zero de aumento de impostos e, de quebra, aleijar um presidente que consideram "socialista".

Torna-se por isso possível o cenário assim descrito para o "Financial Times" por Steve Wieting, analista do Citigroup: "Perguntar como poderia se parecer a economia norte-americana após um eventual calote equivale a perguntar o que você faria depois de cometer suicídio".



Se o Tea Party é movimento religioso, veneram o diabo; ô povo ruim!!
Enoisa

Projeto Excelências


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Estranha metamorfose: os economistas e jornalistas que defenderam, durante décadas, as supostas qualidades do mercado, agora camuflam suas posições. Ou — pior — viram a casaca e, para não perder terreno, fingem esquecer de tudo o que sempre disseram. Para ler, clicar na figura.

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A expansão dos serviços públicos gratuitos pode ser uma grande saída, num momento de recessão generalizada e desemprego. Mas para tanto, é preciso vencer preconceitos, rever teorias e demonstrar que a economia não-mercantil não depende da produção capitalista. Para ler, clicar na figura.