domingo, 26 de junho de 2011

Fabíola Munhoz e Kevin Beneteau

15-M a 19-J: o movimento se expande na Espanha

Reportagem de Fabíola Munhoz e Kevin Beneteau, publicada pela CartaMaior, 24-06-2011.
Fonte: Carta Maior

O último domingo, quando aconteceu a manifestação interacampadas do 19-J, organizada pelo Movimento 15-M, foi um dia inusitado desde o amanhecer. Já no momento em que chegamos à praça, por volta das 11h00, pudemos ver os acampados atarefados, cada um com sua ocupação. Eram como formigas caminhando de um lado a outro, ainda que nesse caso lhes faltasse uma rainha.

A partir do meio-dia, começaram a chegar indignados de outras partes de Barcelona e também de fora da cidade. Chamava especialmente a atenção um grupo que vinha caminhado desde Badalona, cidade catalã localizada a aproximadamente 10 km da capital.

Pouco a pouco, a praça foi se enchendo, e as diferentes caravanas, chegadas de diferentes direções, uniam-se para conversar e compartilhar água ou comida.

O início da marcha estava previsto para as 17h00, mas meia-hora antes já era impossível não se perder em meio à multidão. Foi então que os manifestantes partiram de maneira organizada, até a Via Laietana, rua famosa de Barcelona, que dá acesso ao mar e por onde se pode rumar ao Parlamento Catalão.

Ao longo do caminho, cada vez mais gente saía às ruas para se somar ao protesto, aumentando o tamanho do oceano humano que já se formava, e escorria pelos passeios públicos portando cartazes criativos, soando música, gritando hinos indignados, ou simplesmente fazendo barulho com palmas e panelas.

Quando nos vimos diante daquela massa, pensamos no quanto parecíamos minúsculos e, ao mesmo tempo, sentimos que estávamos diante da oportunidade de documentar algo especial e com potencial para gerar mudanças importantes.

Entre a gente unida, viam-se bandeiras republicanas, independentistas e muitas outras, que representavam, cada uma, uma luta e uma reivindicação diferente. No entanto, essa era um clara minoria entre os milhares de anônimos que haviam se juntado aos demais para apoiar o movimento com ordem e pacifismo, que pudessem fazer de sua ação um verdadeiro exemplo de civismo.

Os participantes da mobilização eram das mais variadas idades e classes sociais. E tinham todos um denominador comum: a vontade de dizer aos ocupantes de cargos públicos que a atual democracia já não os representa.

É verdade que alguns manifestantes, espontaneamente, escalaram a estrutura de paradas de ônibus até alcançar seu teto para, de ali, tentarem se alçar líderes da “revolução”. No entanto, esses indignados mais exaltados foram obrigados a descer de onde estavam pelos demais manifestantes, preocupados com a imagem que poderiam transmitir ao restante da sociedade e aos meios de comunicação.

Embora não tenha havido incidentes, um desses participantes alucinados deu um pouco mais trabalho para os que tentavam manter as coisas tranqüilas, quando se erigiu antes as dezenas de milhares de manifestantes, e imitou Jesus Cristo, proferindo uma mensagem subliminar que muito poucos puderam compreender. A maioria simplemente se sentiu ofendida ao ver alguém seminu, dizendo loucuras, já que considerava a manifestação como algo muito sério: uma oportunidade de mostrar rechaço ao Pacto do Euro, exigindo políticas que beneficiem os cidadãos, e não os mercados.

As mensagens espalhadas pela multidão diziam ao partido socialista (PSOE), no poder atualmente na Espanha, que é urgente deter a supremacia dos interesses das grandes empresas, em detrimento da dignidade da população. Depois de observar a massa durante meia hora, decidimos nos unir à marcha e avançar pela Via Laietana, mas era tanta gente, que o início da manifestação chegou ao destino, sem que a fila tivesse começado a se mover.

Pouco a pouco, porém, foi possível que a multidão saísse do lugar, convertendo-se numa infinidade de individualidades, todas com o mesmo objetivo: expressar indignação. Em meio à Via Laitana, por onde a procissão descia, olhávamos para frente e para trás, sem poder identificar o fim e o começo daquele mar de pessoas, até que alcançamos a Plaza del Palau, ponto de chegada da manifestação.

Ali, parte dos manifestantes decidiu acampar, para conversar reunidos em rodas ou somente observar a manifestação. Nesse momento, também nós paramos para o merecido descanso, até que cada um tomou o caminho de casa, com a ilusão de haver participado de algo histórico.

Apesar das tentativas dos grandes veículos de comunicação, observadas na última semana, de desprestigiar e desmoralizar o movimento 15-M, com base nos embates violentos ocorridos no Parlamento da Catalunha, dessa vez foi difícil encontrar pretexto para tachar os indignados de agressivos.

Foi tão pacífica a ação integrada por desde crianças até idosos, que a Guarda Urbana sequer se aproximou dos manifestantes. Seus integrantes se mantiveram recolhidos em seus carros, observando tudo à distância, enquanto um helicóptero da Polícia sobrevoava o local, despertando vaias e gestos pacíficos dos indignados.

O próximo passo do movimento agora será uma Marcha Popular Indignada que, saindo de várias cidades distintas, passará por 29 lugares da Espanha, entre povoados e municípios, para durante realizar em cada um desses locais assembléias em que os cidadãos possam expressar suas reivindicações. A jornada, que começa neste sábado (25/6) acabará em Madrid, quando essas propostas populares serão apresentadas ao governo espanhol.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Boaventura de Sousa Santos

 A pensar nas eleições


Artigo de Boaventura de Sousa Santos.
Fonte: Carta Maior

Nos próximos tempos, as elites conservadoras europeias, tanto políticas como culturais, vão ter um choque: os europeus são gente comum e, quando sujeitos às mesmas provações ou às mesmas frustrações por que têm passado outros povos noutras regiões do mundo, em vez de reagir à europeia, reagem como eles. Para essas elites, reagir à europeia é acreditar nas instituições e agir sempre nos limites que elas impõem. Um bom cidadão é um cidadão bem comportado, e este é o que vive entre as comportas das instituições.

Dado o desigual desenvolvimento do mundo, não é de prever que os europeus venham a ser sujeitos, nos tempos mais próximos, às mesmas provações a que têm sido sujeitos os africanos, os latino-americanos ou os asiáticos. Mas tudo indica que possam vir a ser sujeitos às mesmas frustrações. Formulado de modos muito diversos, o desejo de uma sociedade mais democrática e mais justa é hoje um bem comum da humanidade. O papel das instituições é regular as expectativas dos cidadãos de modo a evitar que o abismo entre esse desejo e a sua realização não seja tão grande que a frustração atinja níveis perturbadores.

Ora é observável um pouco por toda a parte que as instituições existentes estão a desempenhar pior o seu papel, sendo-lhes cada vez mais difícil conter a frustração dos cidadãos. Se as instituições existentes não servem, é necessário reformá-las ou criar outras. Enquanto tal não ocorre, é legítimo e democrático atuar à margem delas, pacificamente, nas ruas e nas praças. Estamos a entrar num período pós-institucional.

Os jovens acampados no Rossio e nas praças de Espanha são os primeiros sinais da emergência de um novo espaço público – a rua e a praça – onde se discute o sequestro das atuais democracias pelos interesses de minorias poderosas e se apontam os caminhos da construção de democracias mais robustas, mais capazes de salvaguardar os interesses das maiorias. A importância da sua luta mede-se pela ira com que investem contra eles as forças conservadoras. Os acampados não têm de ser impecáveis nas suas análises, exaustivos nas suas denúncias ou rigorosos nas suas propostas. Basta-lhes ser clarividentes na urgência em ampliar a agenda política e o horizonte de possibilidades democráticas, e genuínos na aspiração a uma vida digna e social e ecologicamente mais justa.

Para contextualizar a luta das acampadas e dos acampados, são oportunas duas observações. A primeira é que, ao contrário dos jovens (anarquistas e outros) das ruas de Londres, Paris e Moscou no início do século XX, os acampados não lançam bombas nem atentam contra a vida dos dirigentes políticos. Manifestam-se pacificamente e a favor de mais democracia. É um avanço histórico notável que só a miopia das ideologias e a estreiteza dos interesses não permite ver. Apesar de todas as armadilhas do liberalismo, a democracia entrou no imaginário das grandes maiorias como um ideal libertador, o ideal da democracia verdadeira ou real. É um ideal que, se levado a sério, constitui uma ameaça fatal para aqueles cujo dinheiro ou posição social lhes tem permitido manipular impunemente o jogo democrático.

A segunda observação é que os momentos mais criativos da democracia raramente ocorreram nas salas dos parlamentos. Ocorreram nas ruas, onde os cidadãos revoltados forçaram as mudanças de regime ou a ampliação das agendas políticas. Entre muitas outras demandas, os acampados exigem a resistência às imposições da troika para que a vida dos cidadãos tenha prioridade sobre os lucros dos banqueiros e especuladores; a recusa ou a renegociação da dívida; um modelo de desenvolvimento social e ecologicamente justo; o fim da discriminação sexual e racial e da xenofobia contra os imigrantes; a não privatização de bens comuns da humanidade, como a água, ou de bens públicos, como os correios; a reforma do sistema político para o tornar mais participativo, mais transparente e imune à corrupção.

A pensar nas eleições acabei por não falar das eleições. Não falei?



Projeto Excelências


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