quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Cris Rodrigues - Especial para a Carta Maior

"Violência dos últimos dias é uma questão social"


A reportagem é do jornalista Cris Rodrigues, que mantém o blog Somos Andando. Atualmente, o jornalista vive em Londres.
Fonte: Carta Maior





Ken Smith (foto) é dono de uma loja em Brixton, bairro no sul de Londres em que houve um dos protestos considerados mais violentos da onda de ataques que tomou conta da capital inglesa entre os dias 6 e 9 de agosto. Ele estava lá, apesar de ser tarde da noite de segunda para terça-feira, e viu quando os jovens quebraram vitrines de lojas e colocaram fogo em carros. Sabe que eram muitos, mas não chuta quantos. Todos muito jovens, filhos de uma geração sem limites e sem perspectivas, na visão do lojista.

Smith tem a sua explicação para os protestos que fizeram o mundo todo virar os olhos para Londres, embora ela não seja simples. Para ele, há diversas causas escondidas no que muitos vêem apenas vandalismo e que começou sábado (6) como um protesto legítimo contra o suposto assassinato de um homem por agentes da Scotland Yard, a polícia britânica, na quinta-feira passada (4), no bairro de Tottenham, que registra altos índices de desemprego. Enquanto a maioria acredita que os manifestantes sejam apenas criminosos se aproveitando da situação para roubar, ele sustenta que a violência dos últimos dias é uma questão social.

Esta geração que nasceu lá por 1995 é de jovens excluídos socialmente. Eles vivem uma subcultura. Eu tenho 41 anos, e quando eu era criança eu sabia que, se estudasse e trabalhasse, eu ganharia dinheiro e teria uma vida boa. Hoje eles acham que podem ter dinheiro sem fazer nada.”

Provavelmente muitos dos adolescentes sequer soubessem quem era Mark Duggan e por que os protestos começaram. Mas alguma coisa os tirou de suas casas para que fossem às ruas em uma tentativa de chamar a atenção e saquear. A explicação simplista da vendedora de uma loja que não quis se identificar de que são apenas criminosos “procurando confusão” não convence. “Ninguém é pobre neste país”, reforça o segurança do estabelecimento. Mas então por que tanta gente teria essa índole supostamente má em um mesmo lugar ao mesmo tempo? É sinal de que alguma coisa não vai bem na terra da rainha.

Para Smith, falta educação, disciplina e valores, o que faz com que as crianças não entendam quando estão indo muito longe e ultrapassam os limites. Mas enfatiza que a questão não é racial, embora Mark Duggan fosse negro e há suspeita de que tenha sido assassinato por preconceito.

Ele diz que o problema vem de uma ou duas décadas atrás e reside na diferença de classes, muito marcada na Inglaterra, e incentivada pela mídia. “A TV, a música, tudo influencia para fazer de você quem você é. A TV diz o que você tem que vestir. As crianças querem roupas legais, tênis, celulares. E quando elas não têm as coisas elas ficam frustradas.”

O único policial que aceitou dar algumas informações – eles estão proibidos de falar com a imprensa – estava no bairro de Chalk Farm, no norte de Londres, onde algumas poucas lojas tiveram as vitrines quebradas e alguns de seus artigos roubados segunda-feira (8) à noite. Para Gary Cooper, o termo “riots”, em português “manifestações” ou “distúrbios”, que está sendo utilizado nos meios de comunicação, não se aplica à maioria dos grupos. “São só ladrões. Não estão protestando por nada, só roubando”, disse. Ali, em poucos minutos a confusão foi dissipada. Não houve fogo nem violência.

O fato é que os acontecimentos coincidem com o momento em que a Inglaterra vive sua maior crise nos últimos 50 anos – quem faz a afirmação é o prefeito de Londres, Boris Johnson, também do Partido Conservador, em artigo na edição de terça-feira (9) do jornal Evening Standard, distribuído gratuita e massivamente todas as tardes nas estações de metrô. E, em momentos de crise, quem costuma sentir as consequências são os mais pobres, através da redução de benefícios sociais e do desemprego.

Para ficar em poucos exemplos, este ano o governo do conservador David Cameron cortou bolsas de estudos nas extremamente caras universidades britânicas, ao mesmo tempo em que o valor das anuidades subiu. As restrições para o trabalho de imigrantes estão cada vez maiores, em um país em cuja capital se ouve quase mais línguas estrangeiras do que inglês nas ruas. Ainda que a maioria não tenha consciência do que gera a insatisfação, ela existe.

E o governo, ancorado nos meios de comunicação, não parece muito interessado em procurar explicações. Tem colunista de jornal até citando o filósofo Thomas Hobbes e seu estado de natureza para explicar o caos nas ruas inglesas, como se o problema residisse no excesso de liberdade e a solução estivesse em um governo forte, capaz de decidir por todos. Colocar 16 mil policiais nas ruas foi a única resposta do primeiro-ministro, enquanto afirmava que enfrentaria os criminosos com mãos de ferro, com frases que deixariam os defensores de direitos humanos de cabelo em pé, como estas: “Vocês vão sentir toda a força da lei. Se você tem idade suficiente para cometer crimes, você tem idade suficiente para encarar a punição”. Desta forma, ele joga toda a responsabilidade para os jovens e busca não refletir sobre por que a sociedade tem crianças e adolescentes que cometem esses atos.

A força policial de fato encerrou os protestos, e agora os londrinos dormem tranquilos. Garantir o metrô e os ônibus funcionando e as ruas em aparente tranquilidade parece o suficiente para Cameron. Já são mais de 1.100 pessoas presas na Inglaterra, 805 só em Londres, e assim parece que o problema foi solucionado. De fato, para quem trata uma manifestação social dessa magnitude como “criminalidade, pura e simples”, basta encerrar os ataques que a noite de sono tranquilo está garantida. Mas as pessoas continuam lá, o desemprego aumenta, a crise corrói.

Agora a situação está sob controle na Inglaterra, e a rainha pode ficar aliviada. David Cameron passou por um difícil teste ao controlar a violência, mas só o fato de ela ter começado e de ter atingido a proporção que atingiu já é suficientemente significativo de que o país não está navegando em mares tão calmos e sob controle. Resta saber se agora os olhos vão se abrir e gerar alguma reação política efetiva para a vida dos cidadãos e cidadãs ou se o governo vai continuar fingindo que não aconteceu nada além de incêndios, roubos e três mortes sem causa e sem importância social. Se tratar como um sangramento já estancado, ele vai voltar a abrir.

[grifos do blog]

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