quinta-feira, 20 de maio de 2010

Eric Toussaint

A crise na Europa e a religião do mercado


Eric Toussaint (foto) é presidente do CADTM Bélgica (Comitê pela Anulação da Dívida do Terceiro Mundo), doutor em Ciências Políticas na Universidade de Liége (Bélgica) e na Universidade de Paris VIII (França) em artigo na Carta Maior, 19-05-2010.
Fonte: UNISINOS


Quase todos os dirigentes políticos, sejam da esquerda tradicional ou da direita, sejam do Norte ou do Sul, confessam uma verdadeira devoção pelo mercado e, em particular, pelos mercados financeiros. Na verdade, deveríamos dizer que eles criaram uma verdadeira religião do mercado. A cada dia, em todas as casas do mundo que tem televisão ou internet, celebra-se uma missa dedicada ao deus mercado durante a divulgação da evolução das cotações da Bolsa e dos mercados financeiros. O deus Mercado envia seus sinais através do comentarista financeiro da televisão ou da imprensa escrita. Isso não acontece não somente nos países mais industrializados, mas também na maior parte do planeta. Em Shangai ou em Dakar, no Rio de Janeiro ou em Tombuctu, qualquer um pode saber quais são os “sinais enviados pelos mercados”.

Em todas as partes, os governos promoveram privatizações e criaram a ilusão de que a população poderia participar diretamente dos ritos do mercado (mediante da compra de ações) e que, como contrapartida, se beneficiaria se soubesse interpretar corretamente os sinais enviados pelo deus Mercado. Na verdade, a pequena proporção da população trabalhadora que adquiriu ações não tem o mínimo peso nas tendências de mercado.

Daqui a alguns séculos, talvez alguém leia nos livros de História que, a partir dos anos 80 do século XX, um certo culto fetichista provocou furor. A expansão assim como o poder que esse culto atingiu poderão ser relacionados com os nomes de dois chefes de Estado: Margaret Thatcher e Ronald Reagan. Os livros poderão destacar ainda que esse culto se beneficiou, desde o início, da ajuda dos poderes públicos e das potências financeiras privadas. Na verdade, para que esse culto encontrasse certo eco junto às populações, foi necessário que os meios de comunicação públicos ou privados rendessem-lhe homenagens cotidianamente.

Os deuses desta religião são os Mercados Financeiros, aos quais se destinaram templos chamados Bolsa, para onde só são convidados os grandes sacerdotes e seus acólitos. O povo dos crentes, por sua vez, é convidado a entrar em comunhão com os deuses Mercados mediante a tela da TV ou do computador, o jornal, o rádio ou o guichê do banco.

Até nos rincões mais recônditos do planeta, graças ao rádio ou à televisão, centenas de milhões de seres humanos, a quem se nega o direito de ter suas necessidades básicas satisfeitas, são convidados a celebrar os deuses Mercados. Aqui no Norte, na maioria dos jornais lidos pelos assalariados, pelas donas de casa e pelos desempregados, existe uma seção do tipo “onde colocar seu dinheiro”, apesar da esmagadora maioria de seus leitores e leitoras não ter nenhuma ação na Bolsa. Paga-se aos jornalistas que ajudem aos crentes a compreender os sinais enviados pelos deuses. Para aumentar o poder destes deuses sobre o espírito dos crentes, os comentaristas anunciam periodicamente que eles enviaram sinais aos governos para indicar sua satisfação ou descontentamento.

O governo e o Parlamento gregos, tendo compreendido finalmente a mensagem recebida, adotaram um plano de austeridade de choque que fará com que os debaixo paguem o custo da crise. Mas os deuses seguem descontentes com o comportamento de Espanha, Portugal, Irlanda e Itália. Seus governos também deveriam levar como oferendas importantes medidas anti-sociais para acalmá-los.

Os lugares onde os deuses angustiam-se com a manifestação de seus humores estão em Nova York, em Wall Street, na City de Londres, nas Bolsas de Paris, Frankfurt e de Tóquo. Para medir sua satisfação, inventaram-se instrumentos que levam o nome de Dow Jones em Nova York, Nikei em Tóquio, CAC40 na França, Footsie em Londres, Dax em Frankfurt ou IBEX na Espanha. Para assegurar a benevolência dos deuses, os governos sacrificam os sistemas de seguridade social no altar da Bolsa e, além disso, privatizam.

Valeria a pena perguntar-se porque foi outorgada essa dimensão religiosa a estes operadores. Eles não são nem desconhecidos nem meros espíritos. Possuem nome e domicílio: são os principais dirigentes das 200 maiores multinacionais que dominam a economia mundial com a ajuda do G7 e de instituições como o FMI – que voltou ao centro do cenário graças à crise após ter passado um tempo no purgatório.

Também atuam o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio, ainda que esta não esteja em seu melhor momento. Ninguém sabe se ela poderá ser, de novo, a escolhida dos deuses. Os governos não são uma exceção: desde a era de Reagan e Thatcher abandonaram os meios de controle que contavam para monitorar os mercados financeiros. Dominados pelos investidores institucionais (grandes bancos, fundos de pensões, companhias de seguros, hedge funds...) os governos doaram ou emprestaram aos mercados trilhões de dólares para que pudessem cavalgar de novo, depois do desastre de 2007-2008. O Banco Central Europeu, o Federal Reserve dos EUA e o Banco da Inglaterra emprestaram diariamente, com uma taxa de juro inferior à inflação, enormes capitais que os investidores institucionais se apressaram em utilizar de forma especulativa contra o euro, contra os tesouros dos Estados, etc.

Atualmente, o dinheiro pode atravessar fronteiras sem nenhuma imposição fiscal. A cada dia cerca de 3 trilhões de dólares circulam pelo mundo saltando as fronteiras. Menos de 2% desta soma é utilizada diretamente no comércio mundial ou em investimentos produtivos. Mais de 98% estão envolvidos em operações especulativas, em especial relacionadas às moedas, aos títulos da dívida ou às matérias primas. Devemos acabar com a trivialização desta lógica de morte.

É preciso criar uma nova disciplina financeira, expropriar esse setor e colocá-lo sob controle social, gravando com fortes impostos aos investidores institucionais que primeiro provocaram a crise e depois se aproveitaram dela, auditando e anulando as dívidas públicas ilegítimas, instaurando uma reforma tributária redistributiva, reduzindo radicalmente a jornada de trabalho a fim de poder se contratar massivamente, sem diminuição de salários. Em duas palavras, começar a colocar em marcha um programa anticapitalista.

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