segunda-feira, 7 de junho de 2010

Marshall Auerback

A hipocrisia dos "falcões do déficit" nos Estados Unidos



Marshall Auerback é analista econômico norteamericano. Pesquisador sênior do prestigiado Roosevelt Institute, colabora regularmente com o projeto New Economic Perspectives e com o NewDeal2.0. Tradução: Katarina Peixoto
Fonte: Carta Maior




Harold Meyerson põe o dedo na ferida: “De todos os hiatos que hoje separam nos EUA as opiniões da elite e da massa, talvez o maior seja este: as elites não acreditam realmente que ainda estamos em fase de recessão, ou ocorre de isso não ser o que as preocupa”. O que se torna mais revoltante é que, depois de terem sido os maiores beneficiários da magnanimidade do governo nos últimos anos, são precisamente eles que agora metem o pau na política fiscal “irresponsável” e “insustentável” do governo.

A amnésia coletiva e a depravação moral dessas elites é verdadeiramente inconcebível.

Por que temos um déficit de cerca de 10% do PIB precisamente agora, quando só era de 2% há 3 anos? As razões do estímulo de Obama, o plano de resgate bancário (TARP) e a desaceleração da economia (que respondeu a uma crise fiscal de envergadura, não precisamente causada porque o governo começara a esbanjar irracional e irresponsavelmente). Uma economia desacelerada leva à diminuição de renda (renda diminuída = menor arrecadação fiscal, visto que o grosso da arrecadação tributária procede da receita e das taxas marginais de substituição) e leva a gastos maiores na rede de bem estar social.

Por trás de todo esse furor sobre o déficit estão convenientemente camuflados os beneficiários desta recente prodigalidade pública. Não são, imediamente, os desempregados, nem a grande maioria das pessoas que não trabalha no setor dos serviços financeiros.

E já chega desse memorando agora imperante (- o último a vomitá-lo foi John Heilemann num artigo para a New Yorker Magazine: “Obama vem de Marte, Wall Street vem de Venus”, segundo o qual os custos do resgate financeiro são mínimos, graças às medidas “exitosas” empreendidas para “salvar” nosso sistema financeiro (como se valesse a pena salvá-lo na sua configuração atual). Com a exceção de Simon Johnson, virtualmente todos os analistas passam ao largo do fato de que nossa dívida pública, em relação ao PIB passou, em 2 anos, de 40% do PIB para 90% do PIB, como consequência direta da crise de 2008.

É preciso dizer que os terroristas do déficit se vêem agora fortalecidos por esse fato, esquecendo convenientemente suas causas subjacentes. O mesmo vale, com a conspícua exceção, do mencionado Meyerson, para os jornalistas que cobrem a atualidade econômica. Numa economia de mercado, em que a maioria de nós tem de trabalhar para ter uma existência material, as ameaçadas levantadas pelos Peter Peterson  e a brigada de falcões do déficit representam um verdadeiro assalto ao nosso direito de trabalhar. Como observa meu amigo Bill Mitchell, “os neoliberais atacavam deliberadamente o direito ao trabalho de milhões de pessoas, forçando-as a uma situação de dependência para rapidamente caírem na responsabilidade do sistema de bem estar e lhes ser negado o pobre alívio que esse sistema proporciona”.

As elites que se esgoelam contra esse gasto público (marcadamente as de Wall Street) são como alguém que desse a outro cinco carteiras de cigarro por dia e depois se escandalizasse com o fato de que seu beneficiário contraiu irresponsavelmente um câncer de pulmão.

O que acontecerá ao déficit quando a economia melhorar, se chegar a fazê-lo? O estímulo de Obama e do TARP, ocorra o que houver, desvanescerá em poucos anos. O incremento da receita fiscal e o gasto social cairão. Voltaremos à “normalidade”, com déficits entre 2% e 4%, segundo o estado da economia, como tem sido nos últimos 30 anos, deixando de lado o período de 1998-2001. Até o escritório orçamentário do Congresso (CBO em sua sigla em inglês) concorda com isso. Mas o que ocorrerá em troca, com os cortes fiscais de Bush? Terão um impacto de 2% para mais ou para menos, caso forem revogados ou prorrogados.

O certo é que a melhor forma de conseguir a “estabilidade financeira” que podemos empreender é o pleno emprego, porque com um emprego crescente vem um crescimento da receita e a capacidade, consequentemente, para honrar a dívida. Isso significa menos inadimplência para os bancos e, assim, uma necessidade menor de proceder a resgates públicos.

Em troca, a austeridade fiscal não corta nada. Nossas elites parecem pensar que se pode cortar o “gasto público esbanjador” (quer dizer, reduzir mais a demanda privada) e cortar os salários e, pela mesma razão, as receitas privadas, sem esperar efeitos multiplicadores importantes que piorem significativamente as coisas. Calam-se porque sabem que esse gasto “esbanjador” e “insustentável” nunca parece apontar para o Departamento de Defesa, ao qual sempre temos sido capazes de financiar com alguns bilhões de dólares: dir-se-ia que os princípios de “austeridade nos gastos” nunca foi aplicado pelo Pentágono.

As elites que tomam decisões políticas parecem ter adotado a linha do FMI, segundo a qual os multiplicadores fiscais são relativamente baixos e os estabilizadores, automáticos (que funcionam para incrementar os déficits, enquanto o PIB despenca), não levarão adiante os cortes discretos no gasto líquido derivado dos pacotes de austeridade. Há provas empíricas sombrias de que esta hipótese é falsa e de que a prática dessas políticas fundadas nessa hipótese causa dano – que afetam gerações inteiras – em termos de volume, de produção perdida, em termos de receitas perdidas, em termos de bancarrotas e em termos de emprego perdido (especialmente, negado aos que saem do sistema educacional um começo robusto na vida laboral).

O que realmente está por trás de tudo isso é que as pessoas de visão não querem a menor intervenção pública nos assuntos econômicos, a menos que os beneficie diretamente. Com característica de ingratidão, Wall Street ameaça agora cortar as doações a campanhas eleitorais para Obama e para os democratas, por causa do propósito deles de promover uma maior regulação no setor financeiro. Contudo, quando o governo intervém com resgates, Wall Street põe o chapéu na cabeça e o casaco em mãos. Ninguém deseja enfrentar com a disciplina real dos mercados, se isso significar perdas. Quem está no segmento superior da distribuição da renda não é contra todo tipo de intervenção pública, mas estão frequentemente contra certas intervenções públicas que possam fortalecer a posição dos trabalhadores ou fomentar uma verdadeira competição entre as empresas privadas (no caso de uma escolha pública numa reforma da saúde, por exemplo).

O princípio do pleno emprego é o valor real que deveria guiar a política econômica, não a falsa ênfase em algumas proporções financeiras, sempre em mãos do setor financeiro. Eu duvido muito que esse princípio constitua a inspiração diretriz de nosso “Conselho de Sábios” que delibera sobre o Fundo de Previdência e o Medicare, a portas fechadas.

[grifos do blog]

Projeto Excelências


Clique na imagem e leia as crônicas do professor Fonseca Neto no portal Acessepiauí

Este é um espaço para crítica social, destinado a contribuir para a transformação do Estado do Piauí (Brasil).

Livro

Livro
A autora, Grace Olsson, colheu dados e fotos sobre a situação das crianças refugiadas na África. Os recursos obtidos com a venda do livro possibilitará a continuação do trabalho da Grace com crianças africanas. Mais informações pelo e-mail: graceolsson@editoranovitas.com.br

Frei Tito memorial on-line

Frei Tito memorial on-line
O Memorial Virtual Frei Tito é um espaço dedicado a um dos maiores símbolos da luta pelos direitos humanos e pela democracia na América Latina e Caribe. Cearense, filho, irmão, frade, ativista, preso político, torturado, exilado, mártir... Conhecer a história de Frei Tito é fundamental para entender as lutas políticas e sociais travadas nos últimos 40 anos contra a tirania de regimes ditatoriais. Neste hotsite colocamos à disposição documentos, fotos, testemunhos, textos e outras informações sobre a vida de Tito de Alencar Lima, frade dominicano que colaborou com a luta armada durante a ditadura militar no Brasil.

Campanha Nacional de Solidariedade às Bibliotecas do MST

Campanha Nacional de Solidariedade às Bibliotecas do MST
Os trabalhadores e trabalhadoras rurais de diversos Estados do Brasil ocupam mais um latifúndio: o do conhecimento. Dar continuidade às conquistas no campo da educação é o objetivo da Campanha Nacional de Solidariedade às Bibliotecas do MST, que pretende recolher livros para as bibliotecas dos Centros de Formação. Veja como participar clicando na figura.

Fórum Social Mundial

Fórum Social Mundial
O Fórum Social Mundial (FSM) é um espaço aberto de encontro – plural, diversificado, não-governamental e não-partidário –, que estimula de forma descentralizada o debate, a reflexão, a formulação de propostas, a troca de experiências e a articulação entre organizações e movimentos engajados em ações concretas, do nível local ao internacional, pela construção de um outro mundo, mais solidário, democrático e justo. Em 2009, o Fórum acontecerá entre os dias 27 de janeiro a 1° de fevereiro, em Bélem, Pará. Para saber mais, clicar na figura.

Fórum Mundial de Teologia e Libertação

Fórum Mundial de Teologia e Libertação
É um espaço de encontro para reflexão teológica tendo em vista contribuir para a construção de uma rede mundial de teologias contextuais marcadas por perspectivas de libertação, paz e justiça. O FMTL se reconhece como resultado do movimento ecumênico e do diálogo das diferentes teologias contemporâneas identificadas com processos de transformação da sociedade. Acontecerá entre os dias 21 a 25 de janeiro em Bélem, Pará, e discutirá o tema "Água - Terra - Teologia para outro Mundo possível". Mais informações, clicar na figura.

IBASE

IBASE
O Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) foi criado em 1981. O sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, é um dos fundadores da Instituição que não possui fins lucrativos e nem vinculação religiosa e partidária. Sua missão é de aprofundar a democracia, seguindo os princípios de igualdade, liberdade, participação cidadã, diversidade e solidariedade. Aposta na construção de uma cultura democrática de direitos, no fortalecimento do tecido associativo e no monitoramento e influência sobre políticas públicas. Para entrar no site do Ibase, clicar na figura.

Celso Furtado

Celso Furtado
Foi lançado no circuito comercial o DVD do documentário "O longo amanhecer - cinebiografia de Celso Furtado", de José Mariani. Para saber mais, clicar na figura.

O malabarismo dos camaleões

O malabarismo dos camaleões
Estranha metamorfose: os economistas e jornalistas que defenderam, durante décadas, as supostas qualidades do mercado, agora camuflam suas posições. Ou — pior — viram a casaca e, para não perder terreno, fingem esquecer de tudo o que sempre disseram. Para ler, clicar na figura.

A opção pelo não-mercantil

A opção pelo não-mercantil
A expansão dos serviços públicos gratuitos pode ser uma grande saída, num momento de recessão generalizada e desemprego. Mas para tanto, é preciso vencer preconceitos, rever teorias e demonstrar que a economia não-mercantil não depende da produção capitalista. Para ler, clicar na figura.