quarta-feira, 1 de julho de 2009

Bruno Lima Rocha


Abordando o conceito de dominação – 1

Bruno Lima Rocha, é graduado em jornalismo pela UFRJ, tem mestrado e doutorado em ciência política pela UFRGS e é docente de ciências da comunicação, pesquisador 1 da Unisinos como membro do Grupo Cepos. É editor do portal Estratégia & Análise.
Fonte: UNISINOS


Com este texto, inicio uma série de três artigos breves abordando uma questão urgente para o pensamento crítico latino-americano e mundial. Trata-se do debate a respeito das formas de controle social e sua aplicabilidade. As palavras que seguem se ancoram politicamente na tradição libertária e cientificamente na escola histórico-estrutural.

As relações sociais são o mais importante

Se há uma característica que pode ser criticada na ciência política hegemônica na América Latina (neoinstitucionalista, e conforme já disse antes, braço político do neoliberalismo) é o fato de que esta corrente abandonou a dimensão social da democracia. Ao mesmo tempo, entendemos que a dimensão social não substitui e nem condiciona necessariamente um regime político ou uma modelagem de partilha de poder. Ainda assim, na ausência da sociedade, qualquer análise se torna excessivamente normativa, impossibilitando inclusive a adaptação realista de um modelo poliárquico ou democrático.

Este artigo e o conjunto daquilo que esforçadamente produzo e me afilio, se localiza dentro do campo normativo da radicalização democrática e da defesa dos interesses coletivos. Justo por isso que compreendo a existências de conflitos – latentes e declarados – nas sociedades de classes latino-americanas. E, por entender que a categoria exploração não é absoluta e nem pode ser universal como variável explicativa, vejo como urgente uma categoria de análise que englobe a exploração e abarque outras formas de domínio dentro da estrutura de classes. Por isso apontamos a categoria de dominação.

Ao apontar este conceito de dominação como ferramenta de análise para as maiorias da América Latina, aponta-se o papel da exploração, do imperialismo e a coordenação entre os campos de saber e atuação. Estes fatores permitem e proporcionam a dominação ser predominante em relação à resistência (dos dominados) e a mudança do modo de produção, por aqueles que têm sua força de trabalho explorada.

A dominação começa sendo definida a partir da idéia de legitimidade. Entendemos que deve haver vontade de obediência, uma norma que permita aos dominados obedecer e aos dominantes exercer sua autoridade partindo de algo legítimo. Por vezes esta legitimidade não tem base jurídica formal, mas é uma norma social prévia mesma do direito.

A dominação tampouco se dá necessariamente através do convencimento, mas pode ser também através da coerção, ou da combinação das mesmas. A "naturalização" da existência entre dominantes e dominados, concederia legitimidade para esta situação de fato. Se a prática ao longo do tempo se torna ideologia e ganha legitimidade, 500 anos é um período largo o bastante para "naturalizar" as formas de dominação na América Latina.

A dominação se realiza sob forma de relação, sempre bilateral, onde há um mínimo de vontade (costume, hábito incorporado, naturalizado) entre as partes e os setores. Numa relação normativa, constituindo uma probabilidade composta pelas mútuas expectativas de: mandar e obedecer; explorar e ser explorado; dominar e ser dominado; excluir e se enxergar à margem; reprimir e sentir o peso da repressão; deter a hegemonia e enfrentar as formas de resistência.

Todas estas variáveis (e muitas outras) se materializam e conformam em conteúdos possíveis de fazer parte dos mandatos de dominação. É como se mesmo a mais cruel e sádica forma de dominar o homem sobre o homem tenha limites de eficácia, dentro das expectativas causadas pelas normas (impostas ou subliminares) desta mesma dominação.

A legitimidade é o requisito imprescindível para gerar o consenso necessário, tanto para dar a continuidade como para institucionalizar as formas várias de dominação. O consentimento que gera o consenso, como nos explica Noam Chomsky, é aquele que desenvolve, o consentimento sobre uma base de idéias permitidas pelos opressores. Esta é a base necessária para a estabilidade das normas de dominação.

E como romper com essa normativa de dominação? A quebra dos mecanismos de consenso possibilitaria a resistência e a ruptura dos dominados, sejam estes, mecanismos de idéias, pura força bruta, contrato social da desigualdade, ou a mais comum, a combinação complexa entre ambas as formas de dominação. O consenso dominante é a base da autoridade opressora, o fundamento que se faz notar em distintos níveis, a todos os setores de uma sociedade cuja força criadora e produtiva é dominada por uma minoria hegemônica.

Três formas iniciais de dominação

O sociólogo uruguaio Alfredo Errandonea nos apresenta em seu livro “Sociologia da Dominação” (1986, Nordan Editorial, Montevidéu, pp. 94 e 95) de forma exemplar e genérica, a tipos de sistemas de dominação mais encontrados no capitalismo. Seriam estes:

1) Exploração - esta forma prevalece nas sociedades com economia de mercado e tem um papel de determinante quase exclusivo no capitalismo do tipo gerado na Europa a partir do século XIX. Não se deve omitir a existência de outras formas de dominação econômica, menos freqüentes é verdade.

2) Coação física - é seguramente o mais antigo da história, e está presente como última medida de qualquer sistema de dominação de fato. Sua maior limitação consiste em que seu uso efetivo é muito desgastante. Os aparelhos policiais-repressivos e as organizações militares modernas são a manifestação atual desta forma de dominação.

3) Política-burocrática - é a capacidade de acionar as decisões que afetam a toda uma sociedade, é geralmente constituída pelo conjunto de mecanismos que conformam os organismos de governo e o sistema político-legal, somados com a instrumentalização que implica o aparelho de Estado como um todo, assim se caracterizaria o tipo de dominação político-burocrático.

A estrutura de classes

A forma mais generalizada de dominação na atual etapa do capitalismo é a estrutura de classes. Esta forma se manifesta quando a probabilidade estável (o consenso através do consentimento) de obter obediência contínua se institucionaliza e opera sobre rotinas produtivas. Estas rotinas se baseiam na exploração da força e potencial de trabalho das maiorias pelas minorias proprietárias dos meios.

Não nos referimos somente aos meios de produção, mas também os de violência (coação física) distribuição, circulação de bens (materiais e simbólicos) e capacidades decisórias (organismos internacionais e estatais, instrumentos de normatização da vida social). Assim se dá a relação de dominação.

Já esta instituição contínua de dominação atua e se constitui sobre a maioria dominada as classes sociais. O sistema onde estas ocorrem configura uma estrutura de classes. É fundamental compreender que o conceito de classe é relativo à existência de outras classes. A estrutura de classes sociais se manifesta sobre a distribuição daquilo que é desigual nesta mesma sociedade. Esta desigualdade não se manifesta somente na distribuição dos bens, mercadorias e recursos materiais. Óbvio que a desigualdade de distribuição material tanto é quantitativa (montante, total bruto) como qualitativa (total líquido, valor agregado e simbólico) de meios, bens, mercadorias e divisas de várias formas.

Mas, a estrutura de classes se manifesta de forma mais ampla, conforme veremos nos artigos seqüentes.

Abordando o conceito de dominação – 2

Neste artigo dou seqüência ao texto publicado na semana anterior neste mesmo portal, quando faço uma primeira apresentação do conceito de dominação, tomando por base a produção teórica do especifismo praticado no Uruguai somado com o aporte do também uruguaio Alfredo Errandonea. É importante ressaltar que as formas de dominação operam sobre uma estrutura de classes. Assim, por mais que os neoliberais, pós-modernos e afins intentem afirmar o contrário, a categoria que compõe a estrutura de classes é o próprio conceito de classe. E, é parte da essência deste breve texto e da teoria que a expressa (a matriz libertária de base histórico-estrutural), a definição deste conceito e a construção não economicista dessa importante ferramenta para analisar e incidir na transformação social.

Para começar, é fundamental compreender que o conceito de classe é relativo à existência de outras classes. A estrutura de classes sociais se manifesta sobre a distribuição daquilo que é desigual nesta mesma sociedade. Esta desigualdade não tem existência somente na distribuição dos bens, mercadorias e recursos materiais. Óbvio que a desigualdade de distribuição material tanto é quantitativa (montante, total bruto) como qualitativa (total líquido, valor agregado e simbólico) de meios, bens, mercadorias e divisas de várias formas.

Mas, a estrutura de classes se manifesta de forma mais ampla, sobre tudo o que se distribui desigualmente: podemos citar o acesso diferenciado ou exposição aos meios de comunicação; no exercer do poder político; na barganha e correlação de forças na defesa dos interesses; nas aspirações de prestígio e papel na sociedade; na representação histórica das classes oprimidas dentro do capitalismo; na coação física; no funcionamento e na falsa "isenção" do judiciário e na inexistente "correção" dos desvios da sociedade; na significação religiosa e suas normas de comportamento e conduta e em todas as formas de disputa de poder e relações na sociedade de classes.

A dominação de classes é globalizada

Embora não seja o eixo central deste texto, é fundamental ao menos expor que a dominação de classe é algo que se manifesta de forma global. Simultaneamente ao modo de produção, desenvolveu-se um modo de dominância capitalista sobre o mundo, talvez nunca antes tão desenvolvido como na atual etapa do sistema, mesmo após a mega-estafa que os especuladores chamaram de crise financeira.

Não é função específica deste trabalho abordar o tema da globalização, embora se reconheça a importância do tema, em especial para a compreensão do assim chamado de pensamento único neoliberal. Esta forma de intervir de base neoliberal (e neoinstitucionalista) seria grosso modo, a hegemonia mundializada a partir de uma base de idéias estipuladas como fonte de argumento e raciocínio. Estas mesmas formas de pensamento e ação social da doutrina – o receituário e sua aplicabilidade neoliberal – é legitimada através da mídia capitalista e demais instituições que elaboram discursos válidos que legitimam e dá suporte ideológico-doutrinário a forma de dominação contemporânea.

E como é composta a estrutura de classes da dominação?

Entendo que na atualidade existe uma estrutura contemporânea, onde se dá uma composição de setores sociais, sujeitos sociais e frações de classe que conformam, de maneira posicional, as chamadas classes oprimidas, classes auxiliares e a classe dominante (nesta incluída as frações de elite dirigente). Para uma definição mínima desta hipótese de trabalho, buscamos algo que exista e funcione. Assim, consideramos que são algumas classes (contando com vários setores de classe e dentro destes diversos sujeitos sociais) que sofrem um conjunto de dominações. É critério de análise, portanto, não apenas o salário, mas onde se situa o sujeito social no sistema capitalista, ou seja, sua função social.

Propomos inicialmente 3 fatores econômicos de análise para definir as Classes Dominantes (que é composta da Classe Burguesa + Elites Dirigentes: Elite Política, Elite Militar e Elite Tecno-Jurídica):

- Acúmulo de capital
- Acúmulo de propriedade
- Exploração do Trabalho

Além dos fatores econômicos (Classe Burguesa), a dominação também conta com frações de classe que conformam elites dirigentes. A soma destes exemplos são: Tecnocratas de 1º. Escalão, elites políticas e militares de alta patente (estes são a elite militar). Ao menos na América Latina podemos afirmar que este conjunto conforma uma Elite Nacional. Um exemplo generalizável da elite nacional brasileira: oligarquias, grandes capitalistas brasileiros, elites políticas fisiológicas, tecnocratas, novas elites convertidas vindas da oposição, altas patentes militares e a fração de confiança do capital financeiro e multinacional operando no Brasil.

Uma polêmica que necessita de maior definição é a idéia de uma classe ou de um conjunto de classes oprimidas. Daí o debate a respeito do emprego do conceito Oprimidos ou Classes Oprimidas? Usamos Classes Oprimidas para fazer o recorte que define com quais oprimidos haveria o interesse estratégico de trabalhar. Várias são as Classes Oprimidas, e não uma única classe que sofre opressão. As Classes Oprimidas são compostas por mais de um sujeito social. Quem são estes sujeitos sociais? Minimamente, ao menos em termos de salário, emprego, renda e função, definimos que as Classes Oprimidas são compostas dos setores de Classe Excluída + os setores de Classe Trabalhadora. Assim, os sujeitos sociais das Classes Oprimidas são:

- Trabalhador Assalariado
- Trabalhador Informal
- Trabalhador Precarizado
- Excluídos (que no critério econômico são os desempregados, pecarizados ou subempregados).

Assim, ainda propomos três critérios para pensar a condição de classe a partir do próprio sujeito social:

- Identidade de Classe e sentido de pertencimento
- Possibilidades (de saídas coletivas ou de mobilidade social)
- Necessidades materiais (urgentes e de consumo)
- Demandas políticas (que podem vir a se tornar um projeto coletivo)

A soma destes 4 fatores acima, mais a origem e a posição social, influenciam diretamente na formação da consciência de classe.

Portanto, não caímos no risco de confundir as Classes Oprimidas apenas com aqueles/aquelas que estão sob situação seja de exploração econômica, seja de miséria e exclusão. Mas sim um conjunto de sujeitos sociais, setores de classe, incluindo desde os mais pobres até aqueles que ainda estão no mundo do trabalho e do emprego. Todos estes conformam as Classes Oprimidas.

Pela própria definição da palavra, as classes oprimidas estão sob condição de Opressão, o que implica a soma destas 4 formas de domínio:

- Exploração econômica
- Dominação física (repressiva-jurídico-militar)
- Exclusão da sociedade capitalista, de seus serviços e direitos
- Alienação política + Dominação Política (administrativa-burocrática), desde a forma de ausência do direito de se organizar, até a existência deste direito e a impossibilidade concreta disto acontecer.

No conceito empregado neste trabalho, é a existência conjunta destas 4 formas que geram as Classes Oprimidas.

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