quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho

Brasil aproxima-se do caótico padrão de mobilidade asiático


Análise de Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho, engenheiro de transportes e técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea em artigo na revista Desafios/Agosto 2009.
Fonte: UNISINOS



Nos últimos dez anos, enquanto o PIB brasileiro cresceu a uma taxa média anual em torno de 4%, a venda de motocicletas cresceu a uma velocidade 5 vezes maior (19% ao ano). Essa taxa de crescimento é ainda muito superior àquelas apresentadas pela indústria automobilística, que também vem passando por uma fase pujante nesse período (9% a.a.), e pelos próprios sistemas de transporte público urbano, que apresentaram uma redução no volume de passageiros transportados em relação à década passada. Tudo isso vem alterando profundamente o padrão de mobilidade das cidades brasileiras.

Vários fatores contribuíram para os resultados expressivos da indústria de motos, com destaque para a ampliação do crédito, que permitiu às pessoas de baixa renda acesso a linhas de financiamento com prazos maiores, juros menores e cobertura total do bem. Além disso, destacam-se os incentivos fiscais que essa indústria recebe para se estabelecer na Zona Franca de Manaus - alguns contestados atualmente em função da instalação de novas fábricas chinesas que utilizam peças importadas e não geram empregos localmente -, a consolidação dos serviços de transporte de cargas e passageiros sobre duas rodas e, finalmente, a deterioração do trânsito urbano nas cidades brasileiras, que prejudica o transporte público e torna o seu usuário um potencial comprador de uma motocicleta.

As próprias revendedoras de motos descobriram esse filão de mercado, direcionando o seu marketing de vendas de motocicletas de baixa cilindrada (maior mercado) para atingir os usuários de ônibus, alegando que o valor da prestação do financiamento de uma moto é semelhante ao gasto deles com passagens. Nesse contexto, o encarecimento das tarifas de transporte ocorrido nos últimos 15 anos contribuiu para esse processo.

O Brasil aos poucos vai se aproximando do caótico padrão de mobilidade asiático, onde os veículos de duas rodas (e três rodas) se tornaram a base da matriz modal. A previsão é de que até 2012 sejam comercializadas mais motos no Brasil do que carros, acirrando os conflitos no trânsito.

Mas quais as consequências desse novo padrão oriental de mobilidade urbana que está se desenhando no país? A principal externalidade é o aumento da mortalidade no trânsito. Segundo dados da Pesquisa do Ipea/ANTP sobre custos de acidentes de trânsito (2003), entre 6% e 7% dos acidentes com automóveis nas amostras pesquisadas produziu vítimas, enquanto essa proporção oscilou entre 61% e 82% nos acidentes com motos.

Essa grande propensão à geração de vítimas em acidentes envolvendo motocicletas, oriunda das próprias condições de insegurança do veículo, que não oferece proteção adequada a seus ocupantes e também da forma agressiva de condução do veículo por grande parte dos seus usuários, provoca um aumento da mortalidade a uma taxa superior ao crescimento da frota. No ano de 1996, houve menos de 700 mortes por usuários de motocicleta, enquanto em 2006 esse número subiu para mais de 7.000 mortes, taxa 6% maior do que a do crescimento da frota, apesar da vigência do novo Código de Trânsito Brasileiro, muito mais rígido desde 1997. A frota de motocicletas hoje no Brasil representa menos de 20% do total de veículos em circulação, mas responde por mais de 25% do total de mortes por acidentes de trânsito.

Para agravar a situação, o presidente Lula acaba de sancionar a Lei 12.009/2009, que regulamenta o serviço de mototáxi, proibido até então. Com essa medida, estima-se que as estatísticas de mortes no trânsito irão aumentar bastante, em função do envolvimento de mais uma vítima na ocorrência de acidentes.

Outra externalidade negativa decorrente do padrão asiático de mobilidade é o aumento da poluição sonora e atmosférica nos centros urbanos. A transferência de usuários do transporte coletivo para o individual por si só já é suficiente para gerar maior poluição. No caso das motocicletas, a situação torna-se ainda pior em função dos altos índices de emissão de poluentes e ruídos. Estima-se que com as tecnologias atuais um usuário de moto emita mais de 12 vezes monóxido de carbono do que um usuário de ônibus urbano. Somente agora, 20 anos depois dos primeiros limites de emissões para automóveis e veículos comerciais terem sido estabelecidos, o Conama começou a estabelecer limites de emissões para as motocicletas, o que atrasou o desenvolvimento de tecnologias mais limpas.

Os desafios de mobilidade urbana enfrentados hoje pelos gestores públicos são grandes. As facilidades oferecidas para aquisição de veículos privados pela população, em especial as motocicletas, que hoje podem ser compradas até mesmo em supermercados, são muitas e acabam por reduzir a eficiência e competitividade do transporte público. Da mesma forma que o país precisa de políticas que promovam o desenvolvimento industrial, e que de fato contribuam para a redução das assimetrias regionais, deve haver também preocupação em se implantar políticas que mitiguem as externalidades negativas causadas pelos modos individuais de transporte e que sejam capazes de promover um padrão de mobilidade mais sustentável para as cidades brasileiras.

Não consigo pensar em outra solução que promova, como diz o autor, um padrão de mobilidade mais sustentável do que o retorno das redes ferroviárias que, repito, penso ser um sistema de transporte público eficiente, rápido e de baixo custo.
Enoisa

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